Monday, March 06, 2006

Parte 4:Explosão Cambriana

"O registro fóssil mostra os principais grupos de animais plena e funcionalmente formados num big bang biológico, 'a explosão cambriana', sem ancestrais comuns conforme predito pela teoria. Darwin disse que, se fosse assim, sua teoria 'ruiria'... Darwin subestimou a 'varrida para debaixo do tapete epistemológico' que dariam seus discípulos..."
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São cinco afirmações falsas ou enganosas nas três frases acima.Em primeiro lugar, a evolução não prediz a existência de "ancestrais comuns" no registro fóssil e sim de fósseis intermediários.Espécies fósseis são usualmente interpretados como pontas de ramos extintos em árvores filogenéticas, não como ancestrais.Em segundo lugar, vejamos o que Darwin disse sobre os animais mais antigos do registro fóssil de sua época:

"...não divergem muito das espécies vivas; e, conforme minha teoria, somente poderiam supor estas antigas espécies como antepassados de todas as espécies dos mesmos grupos que surgiram a seguir,porque não apresenta em nenhum grau caracteres intermediários" (Darwin,1987.p.255).

O que está em negrito na citação acima não representa as características de alguns animais mais antigos do nosso registro atual, mas de maneira similar como criacionistas da terra-jovem já fazem, isso é negado*(1).Formas transicionais existem tanto no Cambriano, quanto no pré-Cambriano.Em segundo lugar, não existe "principais grupos animais" em taxonomia e sim filos.Ainda que esse detalhe da citação acima seja ignorado, a idéia está errada do mesmo jeito, porque a maioria dos filos não aparece pela primeira vez no Cambriano, alguns aparecem antes desse período e outros depois.E mesmo as primeiras formas vivas do Cambriano não são as formas modernas que vemos hoje, por isso que se diz que no cambriano também ocorreu a diversificação dos filos.A Explosão Cambriana não foi um "big bang biológico", porque há formas complexas até pouco antes desse período e ela não foi um evento genealógico instantâneo em tempo geológico e sim o período final de um processo de diversificação que demorou aproximadamente 100 milhões de anos.

A Explosão Cambriana é representada por uma a série de faunas mostrando a diversificação dos filos por um período de 15 milhões de anos. Ela tem início após o surgimento da primeira fauna (tecnicamente, "fauna" se refere a um grupo de organismos que se fossilizaram juntos porque viveram juntos) com aparição extensiva dos planos corpóreos que datam em 535 milhões de anos (Conway Morris,2000), embora não se possa omitir uma ascensão constante da diversidade fóssil entre o início do cambriano e a explosão cambriana (Knoll & Carroll. 1999).Entretanto, a Explosão Cambriana não representa a origem da vida complexa, muito menos dos “principais grupos animais”.Há vasta evidência de vida multicelular complexa que aparecem na formação de Doushantuo na China (Chen et al.,2000). Há fósseis pré-Cambrianos e suas datações variam de 546 a 680 milhões de anos, isso sem falar nas algas multicelulares que existiam bem antes disso.O site da instituição científica, a American Scientific Affiliation, mostra a cronologia deles no artigo "Transitional Forms and the Evolution of Phyla" de Glenn R. Morton.

Considerando a classificação taxonômica usada nos nossos manuais para definir os filos hoje, apenas 11 de 32 filos animais aparecem no Cambriano.Outros 20 tem sua primeira aparição depois do Cambriano.Desses, oito aparecem apenas depois do Cambriano e outros 12 filos são aqueles organismos de corpo macio que praticamente não possuem registro devido a ausência de esqueleto mineralizado, como os Platelmintos.Cnidaria seria o único filo pré-cambriano segundo essa classificação.Para maiores detalhes, basta ver o gráfico da University of California Museum of Paleontology (UCMP) .Répteis, mamíferos, aves, peixes , insetos e plantas só surgiram depois.Nosso filo Chordata estava representado por um invertebrado chamado Pikaia.Realmente, existem filos que surgem pela primeira vez no Cambriano. Mesmo assim, nem todos aparecem no período Cambriano.Considerando uma classificação taxonômica desconsiderando a relevância dos "planos corporais modernos" , há indícios que os filos Porifera (Martin et al.,1997), Mollusca (Fedonkin & Benjamin,1997), Annelida ( Cloud & Glaessner,1982),Cnidaria (Conway Morris,1998) e Arthropoda (Waggoner,1996) são encontrados antes da explosão cambriana.A Explosão Cambriana não foi um evento único, mas um processo de diversidade que foi mais visível durante um período que durou cerca de 15 milhões de anos.Fósseis de animais com simetria bilateral aparecem rochas datadas em até 600 milhões de anos (Bojjter,2006,p.63;Valentine, 2000).Sendo assim, dados moleculares e fósseis sugerem que o ancestral comum dos filos com simetria bilateral deve ter vivido entre 600 e 630 milhões de anos (Myers,2004).O bilaterário mais antigo, o Vernanimalcula, tem múltiplas camadas com cavidades pares chamadas celoma, boca e intestino-a primeira característica é uma novidade morfológica inexistente em 13 dos 32 filos animais; o que empurra também o início da evolução dos filos celomados para essa época . Como os primeiros multicelulares aparecem há 1,2 bilhões de anos, os primeiros animais são esponjas assimétricas (Bojjter,2006.p.58) e cnidários (animais de simetria radial) aparecem há 650 milhões de anos no registro fóssil (segundo a cronologia de Stearns & Hoekstra no livro Evolução: Uma Introdução) , a ancestralidade de todos os filos está em um período ainda mais distante do Cambriano.Assim, o processo de diversificação dos primeiros filos animais com simetria bilateral e celoma até os animais do fim da explosão cambriana durou aproximadamente 100 milhões de anos.Fala-se em centenas de milhões anos, caso nos referirmos a evolução de todos os filos que já apareceram no planeta Terra, uma vez que briozoários e plantas só aparecem depois do Cambriano e os cnidários aparecem antes.

A questão é que existem fósseis intermediários entre filos.Enézio parece ignorar a crescente literatura sobre a morfologia intermediária dos animais do registro cambriano e pré-cambriano.

Vai aqui uma pequena lista de referências:

Conway Morris, S. (1998). The Crucible of Creation :Oxford University Press.

Budd, G. E. and S. Jensen (2000). A critical reappraisal of the fossil record of the bilaterian phylo. Biological Reviews 75:253-295.

Budd, G. E. (1999). Does evolution in body patterning genes drive morphological change-or vice nersa? Bioessays 21:326-332.

Matzke,N.(2005).Down with phyla.The Panda's Thumb.
Link:http://www.pandasthumb.org/archives/2005/04/down_with_phyla_1.html

Dado que as classificações de transições dessa categoria taxonômica realmente são bem mais difíceis de ser do que as realizadas entre categorias inferiores, alguns autores não costumam falar em filos intermediários. Entretanto, os dados conseguidos nos últimos anos demonstraram claramente que há fósseis transicionais entre os principais filos.Existem formas transicionais que unem os lobópodos (vermes com patas,uma transição entre artrópodes e vermiformes), os artrópodes, os braquiópodos, os moluscos, e os anelídeos.Taxonomistas são relutantes em colocar uma espécie em um filo novo, mas o simples fato de terem esta atitude não indica a ausência de transições.Sempre foi muito difícil de classificar transições de filos (afinal a natureza não segue concepções arbitrárias) e isso justifica em parte que autores puseram uma espécie em diferentes filos. Wiwaxia já foi colocado junto aos moluscos e aos anelídeos, mas vê-se claramente que reúne característica dos dois filos. Conway Morris relata no livro The Crucible of Creation (p.185-195) que este animal e o Halkieria apresentam um misto de características de diferentes filos: Mollusca, Brachiopoda e Annelida.Esses são membros de um grupo de filos classificados como Lophotrochozoa.Analisando uma figura com um cladograma de setas feitos pela American Scientific Affiliate podemos ver como os cientistas vêem o padrão de relacionamento dos filos utilizando as formas transicionais existentes .No já citado artigo de Glenn R. Morton (onde também está a cronologia dos fósseis), está esclarecido em detalhes a questão sobre a transicionalidade dos filos,incluindo as citações de Conway Morris.Cladisticamente, Halkieria conecta Braquiópodos e Wiwaxia.Este último por sua vez conectam anelídeos e moluscos.Lobópodos, como Anomalocaris, são transicionais entre vermes e artrópodes.Esses dois são representantes do grupo de filos classificados como Ecdyzosoa.Existem intermediários que são pré-cambrianos, como o proto-molusco Kimberella.Existe também o Spriggina e Bomakellia que são mais parecidos com trilobitas que a maioria dos artrópodes atuais, daí vemos o quão sofismático é dizer que todos os filos aparecem "plena e funcionalmente formados".Por fim, também existem intermediários que aparecem no Cambriano, como o Wixaxia.

É falsa a afirmação que é na Explosão Cambriana que se aparece instantaneamente os filos.Contudo, ela é o ponto onde podemos distinguir claramente anelídeos de cordados, por exemplo, mas não significa a existência de aparição instantânea dos filos.Um exemplo que pode nos ajudar a entender a interpretação de fósseis pré-cambrianos.Como podemos reconhecer uma tartaruga no registro fóssil? Pelo casco.Mas existiu um período que o ancestral da tartaruga não possuía o casco e sua identificação fica difícil.A divergência filogenética de diferentes linhagens de um ancestral comum resulta em lacunas.Por exemplo, nunca haverá intermediários entre trilobitas e lampréias.Seus transicionais não são transicionais entre membros vivos dos filos atuais, mas são transicionais em relação aos filos quando estes estavam evoluindo na época.O quão parecidos são em relação as descrições de filos para distinguir nossa fauna hoje, nada tem a nos dizer sobre evolução daquela época.Na fauna pré-cambriana, os animais vermiformes são os mais comuns, já que há larvas de vermes segmentados em Doushantuo datados em 570-520 milhões de anos atrás ( Bengtson & Zhao, 1997).Sabe-se que cerca da metade dos filos são vermes.Existe razão para a evolução predizer que o ancestral comum dos protostomados e deuterostomados foi uma criatura sem características marcantes e semelhante a um verme (Carroll,2006.p.134).Esses animais existem no período pré-cambriano ,mas nós não podemos distinguir exatamente o cordado "vermiforme" do molusco "vermiforme" e nem o artrópode "vermiforme" do nemátodo “vermiforme”.Quando um animal com notocorda aparece pela primeira vez no registro fóssil Cambriano, ele estava representado por Pikaia, um animal quase verme com notocorda, mas não é um peixe.Entretanto, antes dele já tinha surgido um animal chamado Amphioxus com uma notocorda rudimentar.Mais adiante aparece no registro fóssil outro animal com notocorda e uma cabeça, o Haikouella, adicionando mais um passo na morfologia dos cordados (Chen et al.,1999).Adicione a este animal um corpo fusiforme, uma nadadeira e escama, e assim teremos algo que lembra um peixe sem mandíbula.Ou seja, existem determinados passos que antecedem a construção completa do plano corporal de um cordado.Dois requisitos para se analisar a transicionalidade de um animal:uma é fácil, que é o compartilhamento de traços comuns.E outro é uma morfologia que representa estágios de transição refleteriam as mudanças de um táxon para outro.Esta descrição representa a segunda linha de evidência.A evolução de vermes para artrópodes também apresenta certos estágios: (a)vermes, (b)lobópodos, (c)Anomalocaris com apêndices de lobópodos e artrópodes (d) artrópodes.Muitos lobópodos apresentam inovações ao longo do tempo, como segmentação, bifurcação dos membros e exoesqueleto rígido, que mais tarde seriam encontrado em todos os artrópodes (Carroll,2006). Aysheaia não possui nenhuma dessas características e é considerado o mais primitivo do grupo.Opabinia era segmentado, mas não tinha membros bifurcados.Anomalocaris possuía membros bifurcados, mas não tinha um exoesqueleto plenamente rígido.

Evidências moleculares também sugerem a conexão de ancestralidade dos filos.Alguns filos compartilham homologias moleculares impressionantes, incluindo os genes de desenvolvimento que iniciam a formação de olhos e do cérebro.Tais evidências sugerem também que estes animais adquiriram os genes que tipificam os filos bem antes do Cambriano.As profundas homologias moleculares dos genes do desenvolvimento, os quais controlam a formação dos olhos, do cérebro, sugerem que animais adquiriram os planos corpóreos complexos que tipificam os filos antes do Cambriano.Assim, algumas linhagens evoluíram estruturas de armaduras de defesa, enquanto outras linhagens se originaram no início Cambriano.A colinearidade e a função conservada desses genes parálogos é uma forte evidência que apresentam ordem e funções similares num ancestral comum.Eles são compartilhados por cordados, artrópodes, e em parte por nemátodos, moluscos e cnidários (Stearns & Hoekstra, 2003.p.301).De qualquer forma, a relação de ancestralidade dos filos também pode ser obtida por evidências moleculares, não só através de fósseis.

A teoria evolutiva prevê que animais de esqueletos mineralizados evoluíram de animais sem concha ou osso para se fossilizar.Por isso, em algum momento do tempo geológico teríamos uma transição abrupta no registro fóssil de qualquer forma.O que não é previsto (e também não chega a ser contraditório) é que vários filos animais tenham co-evoluídos suas partes duras quase ao mesmo tempo. O que teria causado isso? Existem explicações plausíveis.Vejamos:

-A evolução de predadores ativos no fim pré-cambriano incentivou provavelmente a co-evolução de partes duras em outros animais (Bojjter,2006.p.62).Estas partes duras se fossilizam muito mais facilmente do que os animais de corpo macio precedentes, conduzindo a muitos mais fósseis, mas não necessariamente a mais animais.Não há dúvidas que esses animais de corpo macio podem se fossilizar, entretanto apenas em depósitos de tecido mole, lagerstätten, uma raridade espetacular e que só conhecemos algumas dezenas em toda a Terra*(2).

-Muitos animais complexos antigos podem ter sido quase microscópicos. Fósseis de animais menores que 0,2 milímetros foram encontrados na formação de Doushantuo, China, quarenta a cinqüenta milhões de anos antes do cambriano (Chen et al.,2004). Muita da evolução antiga poderia simplesmente ter sido demasiado pequena para se ver.

-A Terra estava saindo de uma Era do Gelo global no início do Cambriano.Nesse cenário, a vida seria rara, confinadas a lugares como fontes de água e erupções vulcânicas e com uma produtividade ecológica bastante limitada (Ridley,2006.p.558).Uma “Terra bola de neve" antes da explosão cambriana pode ter impedido o desenvolvimento da complexidade ou de populações em nível tal que número de fósseis fossem raros para se encontrar hoje.O ambiente mais favorável depois do fim da “Terra bola de neve” abriria novos nichos para que a vida pudesse evoluir.

-Os genes de Hox, que controlam muita do plano básico do corpo de um animal, provavelmente se desenvolveram neste período. O desenvolvimento destes genes pode então ter fornecido material para que os planos corporais tivessem se diversificado (Carroll,1997).Estes genes são particularmente interessantes para estudos do desenvolvimento, porque sabe-se hoje através da genética molecular do desenvolvimento que não se pode postular a acumulação lenta de mutações pequenas para explicar as diferenças nos planos corporais dos filos, e assim a origem de quase todos os filos não requer necessariamente centenas de milhões de anos para acontecer.Em outras palavras, a evolução de formas multicelulares primitivas não necessitam ocorrer em ciclos "talvez maiores que os compreendidos entre as era cambriana e a atual" como Darwin imaginou.10 ou 15 milhões de anos não é muito para o contexto histórico, mas é mais que suficiente para inventar novos apêndices, alterar planos corporais,etc.Só para ter uma idéia, foi nos primeiros 10 ou 15 milhões de que se seguiu a extinção dos dinossauros que surgiram os principais grupos mamíferos-primatas, roedores, morcegos, carnívoros, musaranhos,etc.

-A partir de 550 milhões de anos, os níveis de carbono orgânico nas rochas cambrianas começam a cair, e o de oxigênio a subir. A habilidade dos animais munidos do novo tipo de intestino de produzir fezes em pelotas acabou reduzindo a quantidade de material orgânico dissolvido na água. Sam Browing, um co-autor de um estudo sobre fósseis cambrianos na China, explicou isso numa reportagem da Science de 2005 e algo sobre isto pode ser visto neste artigo do Jornal da Ciência:“As pelotas fecais afundam antes de oxidar. Então, o oxigênio sobe" .O oxigênio para respiração reduz as restrições para o crescimento e isso foi crucial para o desenvolvimento de animais grandes e de metabolismo mais elevado.

Essa teoria do artefato indica que se os ancestrais de alguns grupos não viveram na mesma época e na mesma localização que os animais encontrados nos pouquíssimos depósitos de tecido mole pré-cambriano no mundo,então o aparecimento abrupto de alguns grupos animais não deveria ser surpresa. E mesmo essa teoria pode ser rejeitada, é só aparecerem novos dados geoquímicos empurrando a elevação do nível de oxigênio para bem antes do cambriano, assim como fósseis de animais com morfologia de predador ativo.

Outros citam a controvérsia envolvendo os que defendem a "hipótese da transição rápida" (a inferência que a maior parte da diversificação dos filos ocorreu no fim do pré-cambriano), que difere da teoria de Conway Morris apresentada aqui.Existem (ou existiram) defensores da primeira teoria como Stephen Jay Gould,Stuart Kauffman e Roger Lewin.A questão é que tentar usar essa teoria como argumento contra as idéias apresentadas aqui se destrói por um detalhe.Os defensores da "hipótese da transição rápida" argumentam que muitos dos filos não aparecem em fósseis antes do Cambriano, mas esses cientistas não acreditam que ausência de fósseis representa ausência de animais.Elas não acreditam que os filos surgiram do nada, sem ancestrais.Logo, eles também postulam que houveram animais que não se fossilizaram e também sabem hoje que a evolução dos filos bilaterários celomados com trato digestivo começou há 600 milhões de anos.Assim, a diversificação de quase todos os filos teria mais ou menos o mesmo tempo para ocorrer em ambas teorias, a única questão polêmica seria saber se a maior parte das mudanças estariam concentradas próximo do fim do Cambriano ou estariam mais diluídas ao longo do tempo.Não existe nenhuma evidência positiva que os filos tiveram a maior parte de sua diversificação bem próximo ao fim do Cambriano, porque o argumento da "transição rápida" se baseia numa negativa que tem pouca importância.A polêmica existe em parte porque o registro pré-cambriano é escasso, em parte porque os ancestrais comuns de filos distantemente relacionados não podem ser reconhecidos e como só fósseis podem fornecer evidências incontestáveis sobre os pontos de ramificação de uma árvore filogenética, a incerteza está estabelescida.A Explosão Cambriana não é vista pelos paleontólogos como um evento genealógico e eles permanecem agnósticos com relação a determinação da data das ramificações filéticas dos principais filos (Gould,2002.p.1156).Apesar disso, se os primeiros animais bilaterários podem ter deixado descendentes no Cambriano, então temos uma evidência contraditória com quem afirma categoricamente que todas as ramificações filéticas estão concentradas no Cambriano.

Outra questão é que alguns pesquisadores preferem classificar de filos na fauna cambriana de Burgess Shale, como filos separados (eu os chamarei de "filos bizarros").Mas o que está por trás da expressão "novos filos"?A questão é que nossa concepção de filo é uma construção moderna.Mesmo que eles fossem "filos extintos" (classificação taxonômica é uma coisa artificial), eles podem muito bem ser animais transicionais parentes dos filos daquela época.Conway Morris fez um grande favor ao analisar em The Crucible of Creation que muitos dos "novos filos" são representados por fósseis de animais que misturam facilmente traços de filos bem conhecidos no Cambriano.Para negar o parentesco deles com os representantes de filos atuais na sua forma de meio bilhão de anos atrás seria necessário fazer uma pesquisa-deixando de lado os pressupostos subjetivos sobre "plano corporais fundamentais" e classificações-demonstrando a negação dessa possibilidade de parentesco e não se perguntando se eles pertencem a filos conhecidos, já que os últimos são construções modernas e nada tem a dizer sobre a evolução existente antes do surgimento dos "planos corporais fundamentais" dos filos atuais (Dawkins,2003.p.358,359).Como fazer isso é quase inviável, então uma alegação de "explicar o aparecimento de novos filos" só pode se referir a animais que desafiam nosso sistema de classificação atual e não necessariamente um conjunto de animais que representam novos grandes ramos filogenéticos que surgiram no Cambriano.

*Nota bene (1):Li recentemente um artigo da Discovery,intitulado "The Scientific Controversy Over the Cambrian Explosion", que afirmava ou que induzia a acreditar que entre os que negam a existência de intermediários entre filos estaria James Valentine, um paleontólogo evolucionista respeitabilíssimo.A realidade é que Valentine é da opinião que certos filos apresentam elos transicionais desconhecidos ou não-confirmados e não que inexistem fósseis intermediários entre filos.Ver a citação que confirma isso:

J.W.Valentine and D.H. Erwin, The "Fossil Record", in the Development as an Evolutionary as an Process (Uas, 1987), p.84.

O já citado artigo de Nick Matzke mostra em detalhes a opinião de Valentine sobre a transicionalidade de filos, com trechos de seu livro On the Origin of Phyla (2004).

*Nota bene(2):Criacionistas acreditam que a teoria do artefato está errada porque o Cambriano está repleto de animais de tecido mole, mas ignoram completamente o fato que o depósito cambriano Burgess Shale é um lagerstätten e ainda por cima com animais com média de tamanho bem maiores que o do Pré-Cambriano.Benton et al (2000) certa vez disseram que "...os 540 milhões de anos passados do registro fóssil fornece uniformemente uma boa documentação da vida no passado".Se o registro pré-cambriano fosse completo e confiável, ele provavelmente diria algo como "os 650 milhões de anos passados..."

*Nota bene(3):Animais minúsculos de tecido mole deixam menos fósseis (vejam citação de Earwin e Valentine na nota bene 1).Obviamente, alguns organismos unicelulares deixam mais fósseis que eles devido a características peculiares.Por exemplo, os foraminíferos possuem carapaças formadas por uma proteína chamada quitina e estas tem uma grande capacidade de preservação.

Referências:

Bengtson, S. and Zhao, Y. (1997).Fossilized Metazoan Embryos from the Earliest Cambrian, Science 277:1645.

Benton, M. J., M. A. Wills, and R. Hitchin.(2000). Quality of the fossil record through time. Nature 403:534-537.

Bojjter, D.J. (2006).Os pioneiros.Scientific American Brasil.Ano 4,Nº46, junho de 2006.

Brasier, M., Green, O. and Shields,G.(1997). Ediacaran Sponge Spicule Clusters from Southwestern Mongolia and the Origins of the Cambrian Fauna. Geology 25, no. 4 : 303.

Carroll,R.L.(1997).Patterns and Processes of Vertebrate Evolution. Cambridge University Press.
Carroll,S.B.(2006).Infinitas Formas de Grande Beleza.Jorge Zahar Editor.Rio de Janeiro-RJ.

Chen, J.-Y,et al.(2000). Precambrian animal diversity: Putative phosphatized embryos from the Doushantuo Formation of China. Proceedings of the National Academy of Science USA 97(9): 4457-4462.Link: http://www.pnas.org/cgi/content/full/97/9/4457

Chen, J.-Y,et al.(2000). Small bilaterian fossils from 40 to 55 million years before the Cambrian. Science 305: 218-222.

Chen, J.-Y., D.-Y. Huang, and C.-W. Li. 1999. An early Cambrian craniate-like chordate. Nature 402:518-522

Cloud, P. and Glaessner M.F.(1982).The Ediacarian Period and System: Metazoa Inherit the Earth.Science 217 (1982): 788.

Conway Morris, S.(1998). The Crucible of Creation.Oxford: Oxford University Press.

Conway Morris, S.(2000). The Cambrian "explosion": slow fuse or megatonnage? Proceedings of the National Academy of Science 97:4429-4429.Link: http://www.pnas.org/cgi/content/full/97/9/4426

Darwin, C. (1987).A Origem das Espécies.Editora Ediouro, Rio de Janeiro-RJ.

Dawkins, R. (2003).O Capelão do Diabo.Editora Companhia das Letras, São Paulo-SP.

Fedonkin,M.A. and Waggoner, B.M.(1997).The Late Precambrian Fossil Kimberella is a Mollusc-like Bilaterian Organism.Nature 388 : 868.

Gould, S. J. (2002) The Structure of Evolutionary Theory. Cambridge, MA: Belknap Press of Harvard University Press.

Knoll, A. H. and S. B. Carroll.(1999). Early animal evolution: emerging views from comparative biology and geology. Science 284:2129-2137

Myers,P.Z.(2004).Blog Pharyngula.Acoelomorph flatworms and precambrian evolution.Link: http://pharyngula.org/index/weblog/comments/acoelomorph_flatworms_and_precambrian_evolution/
Ridley, M. (2006).Evolução, 3 ª edição, Editora Artmed, Porto Alegre-RS.

Stearns S.C. e Hoekstra, R.F. (2003).Evolução: Uma Introdução.Atheneu Editora São Paulo, São Paulo-SP.

Valentine, J.W.(2000).Two genomic paths to the evolution of complexity in bodyplans. Paleobiology 26(3): 513-519.

5 Comments:

Blogger Elyson Scafati said...

Artigo excelente. Muito boa pesquisa sobre um tema de difícil abordagem. Parabéns por desmestificar as idiotices do sr. Enézio.

2:03 PM  
Blogger Bruno Guerreiro de Moraes said...

Quanta falácia!

Bem que o Enézio avisa que os Xiitas Darwinistas são bem versados no discurso sofistico.

Todas essas pseudoexplicações não passam de hipóteses imaginativas delirantes. Não tem fundamento na realidade, os registros fósseis testemunham contra a Teoria da Evolução, as especies aparecem subitamente.

Mas obrigado mesmo assim pelo artigo, ele vai servir bem para mim como referencia para derrubar as pseudoexplicações dos Neon-Darwinistas 'Soldadinhos de Chumbo'.

Fui!

4:10 PM  
Blogger Mário Magalhães said...

Muita coisa escrita é só especulação contra pesquisas cinetíficas de cientistas que estiveram pessoalmente nos lugares pesauisados como o Dr. Paul Nelson. Está mais que claro que os fósseis demonstram complexidade e não demonstram variação vindo de um só ancestral comum.

8:49 PM  
Anonymous Rogerio Marcon said...

Bruno Guerreiro de Moraes, acredita piamente que refutou o artigo utilizando-se de Ad Hominem + AD Nauseam? assim como o Franscisco Mário apenas responde com evidências anedótica?

9:34 PM  
Anonymous Ismael Lemes said...

"Como podemos reconhecer uma tartaruga no registro fóssil? Pelo casco.Mas existiu um período que o ancestral da tartaruga não possuía o casco e sua identificação fica difícil."

como que o "casco" de uma tartaruga aparece de forma ocasional de um momento para o outro em um animal? Sim a Explosão Cambriana acontece de forma similar e sem muita explicação como vc mesmo demonstrou, somente palavras mas não explica os problemas enfrentados pelos evolucionistas.

10:24 AM  

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